Em meio a uma vasta ofensiva policial nos complexos do Alemão e da Penha, na Zona Norte do Rio de Janeiro, membros do crime organizado recorreram a drones equipados com explosivos para contra-atacar as equipes de segurança, em um episódio que marcou a terça-feira (28). A ação, conhecida como Operação Contenção, reuniu aproximadamente 2.500 profissionais das Polícias Civil e Militar, com foco em deter o avanço do Comando Vermelho (CV) e cumprir cerca de 100 ordens de detenção, além de 150 buscas domiciliares direcionadas a chefes da organização, inclusive vindos de fora do estado.
Registros visuais liberados pela Polícia Civil capturaram os aparelhos voadores pairando sobre os agentes e soltando as cargas incendiárias, em uma resposta imediata à incursão das autoridades. Felizmente, não se registraram vítimas diretas dos arremessos, mas o incidente gerou um cenário de caos, com barricadas incendiadas bloqueando acessos principais como a Avenida Brasil e a Linha Amarela, e fumaça densa visível de longe. “É assim que a polícia do Rio de Janeiro é recebida por criminosos: com bombas lançadas por drones”, criticou o governador Cláudio Castro (PL), destacando a ousadia dos adversários.
O balanço preliminar da operação revelou um custo elevado: ao menos 64 óbitos, incluindo quatro policiais civis, e 81 capturas, tornando-a a mais mortal desde 1990 na região metropolitana, conforme dados do Grupo de Estudos dos Novos Ilegalismos da Universidade Federal Fluminense (Geni/UFF). Entre os itens confiscados, destacam-se 93 fuzis, que elevaram o total anual de apreensões no estado para 686, um recorde histórico. Além disso, policiais e civis ficaram feridos por disparos, como um delegado da Delegacia de Repressão a Entorpecentes (DRE), um sargento do Batalhão de Operações Policiais Especiais (Bope), e moradores vulneráveis, incluindo um homem em situação de rua e uma mulher.
Equipamentos pesados foram mobilizados para a empreitada, como dois helicópteros, 32 blindados terrestres, 12 máquinas de demolição e drones de vigilância policial, sob comando da Coordenadoria de Recursos Especiais (Core) e do Comando de Operações Especiais (COE). A ofensiva impactou severamente a rotina local, com 87 escolas suspensas 48 delas nem iniciaram o dia letivo, clínicas de saúde adiando atendimentos e linhas de ônibus desviadas, forçando residentes a se deslocarem a pé em meio ao tiroteio constante.
Essa não é uma novidade isolada no arsenal do CV. Há cerca de um ano, o programa Fantástico revelou como um oficial da Marinha colaborou com o grupo para modificar drones civis em armas capazes de dispersar granadas, mesclando know-how bélico com atividades ilícitas. A reportagem revisitada no ar destacou a prisão, por agentes da Polícia Federal, do cabo Rian Maurício Tavares Mota, detido em um posto militar em Niterói. Ele foi identificado como o arquiteto de mecanismos para fixar explosivos nos voadores e como instrutor de bandidos em embates contra concorrentes.
As apurações apontaram que Rian empregava os dispositivos não só para ofensivas, mas também para rastrear movimentos policiais e fornecer dados cruciais ao CV. Em sua residência, as buscas desenterraram um abrigo subterrâneo equipado para resistir por dias, sugerindo preparo para fugas prolongadas. “Nós precisamos comprar o dispensador, chefe. É um dispositivo que bota no drone, que ele libera a granada, entendeu? Sendo que vem um cabinho segurando no pino, né? Bota o pino no drone e a granada nesse dispositivo”, confidenciou um comparsa em gravação obtida pela PF.
O parceiro em questão era Edgar Alves de Andrade, conhecido como Doca, figura proeminente na hierarquia do CV. Autoridades federais enfatizaram que o episódio reflete um padrão mais amplo, com inquéritos anteriores detectando o emprego de drones modificados por diversos bandos no Rio para arremessos de bombas. Em diálogo de 2 de fevereiro de 2024, interceptado pela operação, Rian compartilhou com Doca um clipe demonstrando o lançamento de projéteis via drones na Guerra da Ucrânia, propondo replicar a técnica contra inimigos internos da facção.
A Operação Contenção, prorrogável até 16 de dezembro de 2025, representa uma resposta estatal à dominação territorial do CV em 26 comunidades desses complexos, abrangendo 9 milhões de metros quadrados de áreas desafiadoras para incursões. “Estamos falando de 9 milhões de metros quadrados de desordem urbana [nos complexos do Alemão e da Penha], com becos intransitáveis, casas irregulares e criminosos que dominam o território. É impossível enfrentar isso apenas com o efetivo do estado”, observou o secretário de Segurança, Allan Turnowski, em entrevista ao Bom Dia Rio, da TV Globo.
Além dos confrontos iniciais, relatos incluem moradores coagidos a registrar a submissão de suspeitos em vídeo e pilhas de armamento expostas, como um monte de fuzis. Criminosos foram flagrados em fuga organizada, em formação linear pela Vila Cruzeiro. A tática dos drones, inédita em escala no Brasil, sinaliza uma escalada no poderio do crime organizado, misturando inovação tecnológica a disputas pelo controle do narcotráfico. A investigação segue, com foco em desarticular redes que importam expertise militar para o submundo.
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