Facção criminosa coordena punições e vigilância via apps nos complexos da Penha e do Alemão

Investigação revela uso de mensagens para impor castigos e organizar guardas em territórios controlados pelo Comando Vermelho
Por: Brado Jornal 29.out.2025 às 09h19
Facção criminosa coordena punições e vigilância via apps nos complexos da Penha e do Alemão
Foto: Reprodução
A megaoperação deflagrada nesta terça-feira (28) nas comunidades da Penha e do Alemão, na Zona Norte do Rio de Janeiro, expôs como líderes do Comando Vermelho (CV) utilizam grupos em aplicativos de mensagens para gerenciar desde punições severas contra moradores até a distribuição de funções de proteção nos pontos de tráfico. Essa ação, que resultou em pelo menos 64 mortes incluindo quatro policiais e 81 prisões, é considerada a mais letal da história do estado, com base em dados confirmados pelo governo fluminense. A ofensiva, batizada de Operação Contenção, mobilizou cerca de 2.500 agentes das polícias Civil e Militar, com apoio de helicópteros, blindados e drones, e visava cumprir 100 mandados de prisão e 150 de busca e apreensão em 26 comunidades controladas pela facção.

As apurações, conduzidas pela Delegacia de Repressão a Entorpecentes (DRE) ao longo de mais de um ano, identificaram 94 criminosos escondidos nessas áreas, incluindo 32 paraenses que supostamente comandavam atividades ilegais à distância no Pará, como tráfico de drogas, assassinatos, assaltos e associação ao crime organizado. A Polícia Civil do Pará colaborou com trocas de inteligência para mapear essas conexões interestaduais. Durante a ação, foram apreendidos 93 fuzis, elevando o total de armas desse calibre confiscadas no Rio em 2025 para 686 um recorde anual que reflete o intensivo combate ao armamento pesado da facção.

Entre os detidos, destacam-se Thiago do Nascimento Mendes, conhecido como Belão do Quitungo, um dos principais comandantes do CV na região, e Nicolas Fernandes Soares, operador financeiro ligado diretamente a Edgar Alves de Andrade, o Doca ou Urso. No entanto, Doca conseguiu escapar do cerco e segue foragido, apesar de acumular 269 anotações criminais e 26 mandados de prisão em aberto. Ele é apontado como o arquiteto da expansão do Comando Vermelho por diversos bairros da capital, consolidando o controle territorial da quadrilha. Doca, ao lado de Juan Breno Ramos (o BMW) e Carlos Costa Neves (o Gadernal), foi denunciado pelo Ministério Público estadual pelos homicídios de três médicos na Barra da Tijuca, em 2023.

As mensagens interceptadas pela polícia revelam o funcionamento interno do grupo: BMW é o executor principal das sanções impostas pela facção, que vão de agressões físicas a torturas e execuções sumárias, aplicadas a quem viola as regras do CV nos complexos. Para evitar conflitos em festas de funk, por exemplo, os bandidos implementaram uma tática cruel: obrigar mulheres envolvidas em brigas a ficarem imersas em tambores cheios de gelo. Outras práticas incluem sessões de espancamentos coletivos e ordens diretas de morte.

Um caso emblemático capturado nas investigações envolve Aldenir Martins do Monte Junior, um residente arrastado por sete minutos pelas vielas da favela, algemado e com a boca tampada. Durante o suplício, transmitido ao vivo por videochamada, a vítima foi coagida a revelar informações sobre uma quadrilha rival, enquanto BMW zombava da situação e fazia piadas com o homem. Em paralelo, BMW iniciou uma chamada de vídeo com Gadernal, outro membro chave, para compartilhar o episódio em tempo real. Aldenir permanece desaparecido, e as autoridades presumem que ele tenha sido assassinado.

Registros semelhantes mostram Gadernal exibindo, via videochamada, a tortura de um indivíduo sendo rebocado pelas ruas da comunidade, com moradores como plateia involuntária. Essas transmissões não só servem para intimidar, mas também para coordenar as escalas de segurança: os apps são usados para designar quem vai vigiar os "bocas de fumo" ou escoltar Doca em suas movimentações diárias. Em uma troca específica, Doca foi informado de que contaria com seis traficantes armados no dia seguinte para sua proteção pessoal.

Em retaliação à operação, membros do CV bloquearam vias cruciais do Grande Rio, como a Linha Amarela, a Grajaú-Jacarepaguá e a Rua Dias da Cruz no Méier, usando carros como barricadas. Além disso, lançaram bombas via drones no Complexo da Penha, intensificando o caos. Imagens aéreas capturaram criminosos fugindo em fila pela mata na Vila Cruzeiro, evocando cenas da ocupação policial de 2010 no Alemão. Os confrontos mais violentos ocorreram na região da Vacaria, com rajadas de tiros ecoando por horas e deixando pelo menos sete policiais e três civis feridos por fogo cruzado.

O secretário de Segurança Pública do Rio, Victor Santos, descreveu os complexos como "9 milhões de metros quadrados de desordem" e defendeu a necessidade de uma mesa de diálogo entre estado, União e município para enfrentar o avanço do crime organizado. Ele destacou que as áreas abrigam cerca de 280 mil habitantes e que a operação, embora trágica, é "necessária" para conter a expansão do CV. A Defensoria Pública da União repudiou o pico de letalidade, cobrando medidas para mitigar a violência contra a população civil.


📲 Baixe agora o aplicativo oficial da BRADO
e receba os principais destaques do dia em primeira mão
O que estão dizendo

Deixe sua opinião!

Assine agora e comente nesta matéria com benefícos exclusivos.

Sem comentários

Seja o primeiro a comentar nesta matéria!

Carregar mais
Carregando...

Carregando...

Veja Também
Megaoperação contra avanço do Comando Vermelho nos complexos do Alemão e da Penha resulta em confrontos e prisões
Tiroteios intensos e uso de drones por criminosos marcam fase da Operação Contenção
Moradores expõem dezenas de corpos em praça após ação policial letal no Rio de Janeiro
Comunidade da Penha denuncia subnotificação em megaoperação contra o Comando Vermelho
Origens e expansão do Comando Vermelho pelo país
A ação policial mais sangrenta do Rio visa barrar o domínio da facção mais duradoura do estado
Drones armados intensificam confronto no Rio: Facção adota táticas avançadas com suporte de ex-militar naval
Ataque aéreo contra forças policiais expõe evolução do crime organizado na disputa territorial da capital fluminense
Vitória e a maior da história: operação policial no Complexo do Alemão resulta em 64 mortes
Denominada Operação Contenção, a iniciativa visa impedir o avanço territorial do Comando Vermelho (CV) e capturar líderes da facção
Carregando..