Durante a semana anterior, Salvador enfrentou chuvas intensas provocadas por uma frente fria que se estabeleceu sobre a Bahia, deixando marcas de alagamentos e deslizamentos em diversos pontos da cidade. Agora, com a influência do fenômeno La Niña, especialistas preveem uma primavera ainda mais úmida, com volumes de precipitação acima da média climatológica, o que reacende preocupações sobre a capacidade da capital em lidar com eventos extremos.
O meteorologista da Defesa Civil de Salvador (Codesal), Giuliano Carlos, detalha que o La Niña ocorre quando as águas superficiais do Oceano Pacífico Equatorial se resfriam além do normal, alterando padrões de ventos, pressão atmosférica e distribuição global de chuvas. Em entrevista ao MASSA!, ele afirma: “La Niña é um fenômeno climático que acontece quando as águas do Oceano Pacífico Equatorial ficam mais frias que o normal. Esse resfriamento altera os ventos, a pressão do ar e a distribuição das chuvas, provocando impactos significativos em diversas regiões do mundo”.
Na prática, isso significa pancadas de chuva curtas, mas de alta intensidade ao longo dos próximos meses. Giuliano observa: “Esse período é marcado por calor, umidade, o que favorece a formação de nuvens e, consequentemente, chuva. Somente nesta semana [semana passada], em um período de 12 horas, choveu 124 milímetros, superando a normal climatológica de 91 milímetros. A tendência é que, nos próximos meses, o volume de chuvas permaneça acima da normal climatológica”. O fenômeno pode se estender por meses ou até dois anos, variando seus efeitos conforme as condições locais.
Em bairros com encostas, como Jardim Cajazeiras, o temor de deslizamentos é diário. Jefferson Santos, auxiliar de TI que reside na Rua Juracy Trindade, ainda se recupera do trauma de um deslizamento anterior que destruiu parte de seu muro e atingiu a casa onde vivia com a família. Ele relata: "Sofremos esse trauma de ter um deslizamento ocorrendo na sua casa, é horrível, não só eu quanto os meus vizinhos, pois fica aquele susto, perdemos tudo. Fica aquela sensação: será que vamos poder reconstruir".
Sem apoio financeiro para intervenções estruturais, Jefferson adota uma abordagem natural, plantando vegetação para estabilizar o solo. “Eu recorro à natureza. O local onde deslizou, por exemplo, ramou muitas plantas que estão segurando o barranco. Houveram chuvas que eu fiquei observando que essas plantas estão ajudando. Eu evito cortá-las e, pelo contrário, fico limpando o lixo, e fico jogando sementes. Eu sei que é um trabalho de formiguinha, porque muitas vezes o pessoal pode achar que eu estou plantando mato, mas eu tenho minha consciência que eu posso estar ajudando”.
A Prefeitura de Salvador, por meio da Secretaria Municipal de Infraestrutura e Obras Públicas (Seinfra), responde com investimentos em contenção de encostas. O secretário Luiz Carlos de Souza descreve as técnicas disponíveis: “Uma cortina atirantada é um projeto que é muito mais demorado, é um projeto muito mais caro e um projeto que demanda mais tempo. O solo grampeado já é um projeto intermediário entre a atirantada e a geomanta. Então ele é um projeto que é feito com mais rapidez. A cortina atirantada é uma estrutura de contenção ativa, geralmente de concreto armado (convencional ou projetado), que trabalha em conjunto com tirantes para estabilizar o solo”.
Atualmente, o município finaliza o orçamento para 21 novas contenções, com aporte estimado em R$ 120 milhões. Desde 2013, foram entregues 240 contenções e aplicadas 318 geomantas, totalizando 558 áreas protegidas. Luiz Carlos detalha o histórico: “Nos últimos anos, já investimos R$ 261 milhões na proteção de 564 áreas. Parte disso foi realizada na gestão de ACM Neto, com 97 obras, e outra parte na de Bruno Reis, que já atuou em 148 locais. Atualmente, temos 21 intervenções em andamento, e o prefeito deve autorizar mais de R$ 100 milhões em novas obras de contenção, incluindo a da Irmã Dulce, em Cajazeiras 6, cujo projeto e licitação já estão finalizados”.
A classificação de risco considera múltiplos fatores, conforme o secretário: “Tem a questão dos solos, do peso que está em cima dessa encosta e o que está embaixo. Aí tem também o fator de drenagem, o fator do esgoto, como é que está sendo canalizado esse esgoto das residências que são implantadas. O tipo de corte que foi feito, entre outras coisas”. Em situações críticas, famílias são removidas temporariamente, com indenização e aluguel social até a conclusão das obras.
O diretor-geral da Codesal, Sosthenes Macedo, enfatiza a prevenção contínua: “O que precisamos é seguir com nossos programas: o Plano Municipal de Redução de Riscos, o mapeamento das áreas vulneráveis, a capacitação dos moradores e o apoio do núcleo comunitário de proteção e defesa civil. Também temos o Projeto Defesa Civil nas Escolas (PDCE), voltado para nossas crianças, que acontece na sede do órgão toda primeira sexta-feira do mês”. Ele acrescenta que ações como geomantas, macrodrenagem, limpeza de canais e poda de árvores são coordenadas com outras secretarias para preservar vidas.
Embora a Seinfra não confirme intervenções específicas no endereço de Jefferson, o conjunto de medidas busca mitigar os impactos do La Niña em uma cidade historicamente vulnerável a chuvas intensas.
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