A recente ordem do presidente Donald Trump para que o Pentágono utilize força militar contra cartéis de drogas latino-americanos reacendeu temores de uma nova onda de intervenções dos Estados Unidos na América Latina. A medida, que ecoa a Doutrina Monroe — usada historicamente para justificar a supremacia militar dos EUA no continente —, levanta preocupações sobre possíveis operações em territórios de países como México e Venezuela, onde cartéis foram classificados como organizações terroristas.
Há pouco mais de dez anos, o governo Obama anunciou o fim da Doutrina Monroe, sugerindo um declínio nas intervenções militares americanas na região. Contudo, a decisão de Trump marca um retorno a políticas de confronto, intensificando a desconfiança em nações como o Equador, que enfrentam suas próprias batalhas contra o narcotráfico. A possibilidade de ações militares externas alimenta o sentimento antiamericano, especialmente em países com memórias de intervenções passadas.
“Sou um conservador de direita, então quero cidadãos armados e o Exército atirando de fato,” disse Patricio Endara, 46, empresário de Quito, no Equador. “Mas eu não concordaria com soldados estrangeiros no Equador.”
O histórico de intervenções dos EUA na América Latina, como o golpe na Guatemala em 1954, apoiado para proteger interesses da United Fruit Co., ou as ocupações de Haiti (1915-1934) e Nicarágua (1912-1933), reforça o ceticismo. Durante a Guerra Fria, os EUA apoiaram golpes no Brasil, Chile e Guatemala, além de intervenções em Granada e na República Dominicana, muitas vezes sob o pretexto de combater o comunismo.
“Essas são fórmulas que demonstraram, até a exaustão, seu fracasso,” afirmou o senador colombiano Iván Cepeda. Já o acadêmico guatemalteco Fernando González Davidson destacou que tais ações frequentemente entregam o poder a “uma classe corrupta e criminosa alinhada aos interesses dos EUA.”
A invasão do Panamá em 1989, chamada de “Operação Justa Causa” pelos EUA, permanece na memória como “Proibido Esquecer” para os panamenhos, segundo Efraín Guerrero, líder comunitário da Cidade do Panamá. Essa operação pode servir de precedente para ações em países como a Venezuela, onde os EUA oferecem US$ 50 milhões por informações que levem à captura de Nicolás Maduro, acusado de ligações com o cartel de Sinaloa e o Tren de Aragua.
“Espero que ele faça isso,” disse uma mulher de Maracaibo, na Venezuela, sob anonimato, expressando apoio a uma possível intervenção contra Maduro. “É isso que estamos esperando há anos, que Maduro saia ou que Trump o leve.”
A designação de cartéis como grupos terroristas e a ameaça de ações militares também podem impactar a economia dos EUA, segundo analistas. “Essa ação ou ameaça do governo Trump vai realmente tocar aquele nervo histórico e profundamente enraizado,” alertou Christopher Sabatini, especialista em América Latina do Chatham House.
A resistência à intervenção é reforçada pela valorização da soberania nacional, um princípio central para muitos latino-americanos. “Tem havido uma vontade férrea entre os latino-americanos de definir como um de seus valores centrais a soberania nacional e a não intervenção,” observou Alan McPherson, historiador da Temple University.
Enquanto líderes regionais tentam compreender o alcance da ordem de Trump, a América Latina se prepara para possíveis desdobramentos, temendo que a história de interferências externas se repita.
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