Michele Marinho Costa, assistente de Recursos Humanos de 40 anos, enfrentou um câncer de mama em estágio três, diagnosticado em janeiro de 2024. Após um ano de tratamento intenso, com quimioterapia e radioterapia, ela recebeu alta médica e se preparava para retomar a vida profissional em Simões Filho, na região metropolitana de Salvador. Contudo, no dia marcado para seu retorno, 24 de abril de 2024, foi surpreendida com a demissão no primeiro contato com a empresa. “Eu achei que nesses dois dias eles estavam planejando alguma surpresa para o meu retorno. Quando chego na empresa, não tinha surpresa nenhuma,” relata Michele.
A profissional, que esteve afastada pelo INSS até março de 2024, comunicou ao setor de Recursos Humanos sua liberação para trabalhar, confirmada por laudos de sua oncologista e do médico do trabalho. Apesar disso, o dono da empresa a chamou para uma reunião e informou que não poderia mantê-la no quadro. “Nesse momento, foi como se eu estivesse recebendo uma sentença, como eu recebi a notícia do câncer de mama,” conta. A demissão, segundo ela, foi claramente motivada pelo tratamento da doença. “Eu não imaginava que a empresa iria fazer comigo, de forma alguma,” desabafa.
O impacto emocional foi devastador. Michele relata: “Quando cheguei em casa, eu desabei. Tive que entrar em contato com psiquiatra para poder tomar remédio. Eu não conseguia dormir, me senti completamente abandonada.” Sem emprego, ela conta com o apoio do companheiro, que ganha um salário-mínimo, e recebeu cinco meses de seguro-desemprego. “Toda vez que eu falo sobre isso, eu me emociono, porque ninguém merece passar por isso. É de um nível de desumanidade tremendo,” finaliza.
Direitos trabalhistas e estabilidade em casos de doença
A demissão de Michele levanta questões sobre os direitos de trabalhadores em situações de saúde delicadas. Conforme o artigo 118 da Lei 8213/91 e a Súmula 378 do Tribunal Superior do Trabalho (TST), a estabilidade provisória de 12 meses após o retorno é garantida apenas para quem recebe auxílio-doença acidentário, relacionado a acidentes de trabalho. Para o auxílio-doença comum, como no caso de Michele, a lei não assegura estabilidade após a alta médica, permitindo a demissão.
No entanto, a advogada Sara Carvalho, especialista em Direito do Trabalho, destaca que demissões discriminatórias podem ser contestadas judicialmente. “A empresa também deve ter atenção a casos de dispensa discriminatória, quando o empregado tem doença grave que cause estigma (como câncer ou HIV). Se caracterizada discriminação, a dispensa é nula e pode gerar reintegração, indenização em dobro e danos morais,” explica. A empresa também pode ser responsabilizada se a doença tiver relação com o trabalho, mesmo classificada como comum pelo INSS, ou se houver alteração contratual lesiva, como a exclusão do plano de saúde durante o afastamento.
Michele moveu uma ação trabalhista contra a empresa, cuja identidade ela optou por não revelar. A segunda audiência do processo está marcada para este mês.
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