O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, manifestou nesta quarta-feira críticas ao deputado Guilherme Derrite (PP-SP), relator do projeto Antifacção e secretário licenciado de Segurança Pública de São Paulo, ao afirmar que ele não possui conhecimento adequado em "inteligência e investigação" contra o crime organizado. Haddad questionou a pressa na votação do texto legislativo.
Nós demos uma demonstração de integração para asfixiar o crime organizado há dois, três meses. Você vai colocar isso a perder em função do açodamento de um relator que, com todo respeito, não é propriamente uma pessoa que entenda de inteligência e investigação, não é uma pessoa versada em investigação e inteligência disse Haddad. Ele destacou a ausência de diálogo com o governo federal, o que, na sua visão, resulta em versões do projeto que diminuem a atuação da Polícia Federal (PF) e da Receita Federal no enfrentamento às organizações criminosas.
Não entendo esse açodamento de votar a lei sem uma discussão com o governo. São órgãos de estado, a PF é do país, a Receita tampouco é de governo, são órgãos de estado, e enfraquecer eles não faz o menor sentido. Na manhã desta quarta, Haddad se encontrou com o diretor-geral da PF, Andrei Rodrigues, no Ministério da Fazenda, para discutir a coordenação entre o órgão e a Receita Federal.
Estamos afinando esses procedimentos, as trocas de informações entre os dois órgãos. Mais cedo, a ministra da Secretaria de Relações Institucionais (SRI), Gleisi Hoffmann, indicou que quatro aspectos do projeto precisam ser removidos pelo relator, pois são considerados "inegociáveis" pelo governo e poderiam alterar completamente a proposta original, elaborada pelo Ministério da Justiça. O Palácio do Planalto busca adiar a votação do parecer de Derrite. Esses pontos foram debatidos em reunião matutina entre a SRI, o Ministério da Justiça e a Casa Civil, focando no relatório apresentado na terça-feira à noite pelo secretário licenciado.
Derrite expressou preocupação em elaborar um texto que evite questionamentos no Supremo Tribunal Federal (STF) e admitiu possibilidade de novas alterações, tendo já submetido três versões diferentes. Gleisi explicou que o Ministério da Justiça continua avaliando detalhes, mas o grupo priorizou elementos essenciais: A gente focou naquilo que é estruturante e que pode realmente tornar a lei totalmente ineficaz, que são esses pontos afirmou Gleisi Claro que outros pontos são pontos que a gente vai buscar conversar, ajustar, mas esses eu diria que são pontos praticamente inegociáveis, porque desconfiguram o projeto, disse.
Ela defende o adiamento para permitir ajustes: Conversei com os nossos líderes de governo para que conversassem com o presidente do Motta, dissessem à direção da Casa, se vai votar hoje mesmo. Se não votar, eu quero marcar com ele para a gente conversar. Pela complexidade da matéria, seria importante ter mais tempo pra discutir. E arredondar todos os pontos acrescentou Gleisi.
Quatro pontos do projeto que o governo quer eliminar:
Sobreposição de leis: O parecer mais recente de Derrite cria uma nova norma sobre organizações criminosas sem revogar a anterior, gerando erro técnico legislativo segundo o Ministério da Justiça. Isso permitiria que advogados de acusados invocassem a lei antiga, com penas mais leves, devido à pressa na tramitação.
Risco de perda de recursos pela PF: O texto destina de forma genérica bens apreendidos de traficantes e criminosos organizados a fundos estaduais ou distritais de Segurança Pública. Para o Ministério da Justiça, em casos federais, os valores deveriam ir para o Fundo para Aparelhamento e Operacionalização das Atividades-fim da Polícia Federal (Funapol) e o Fundo Penitenciário Nacional (Funpen), sob pena de inconstitucionalidade e redução de recursos para a PF e presídios federais.
Tipificação penal de "facção criminosa": A proposta inicial criava o crime específico de "facção criminosa", mais estruturada que organizações comuns, com domínio territorial, econômico e atuação interestadual ou transnacional, visando enquadrar facções e milícias – considerado o cerne do projeto. Derrite removeu isso e inseriu "domínio social estruturado", com 11 condutas, como uso de violência para controle de comunidades, restrição à circulação de pessoas e bens, ou ataques a presídios. O governo prefere a tipificação original por ser mais clara e adaptada à realidade.
Confisco de bens: No parecer de Derrite, bens de criminosos só podem ser confiscados após o fim do processo judicial. A versão original permitia isso desde o início da investigação para sufocar financeiramente as quadrilhas. "Colocamos no projeto que essas facções perdem os seus bens a partir do momento que começa a investigação. No relatório isso só vai acontecer só depois do trânsito em julgado da sentença condenatória e você corre o risco de não capturar esses bens", explica Gleisi.
Técnicos do Ministério da Justiça, ao analisar a terceira versão do texto, concluem que a votação deve ser postergada: Não tem a menor condição do projeto ser votado da forma que está. Você pode acabar colapsando o sistema penal e prisional, o que vai beneficiar o crime organizado afirmou o secretário Nacional de Assuntos Legislativos da pasta, Marivaldo Pereira.
A equipe defende retornar ao texto original, que elevava penas para líderes de facções e reduzia para membros com bons antecedentes e sem comando. Atualmente, a pena de 20 a 40 anos aplica-se a qualquer integrante, sem mitigantes. O projeto também impede "anistia, graça, indulto, fiança e livramento condicional" para suspeitos desses crimes, o que pode elevar a população prisional.
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