As tentativas incessantes do Banco Master e de seu principal acionista para conquistar apoio na Praça dos Três Poderes e na avenida Faria Lima fizeram com que a ação policial que resultou na prisão de Daniel Vorcaro e na extinção do banco fosse vista com ceticismo por diversos atores em Brasília. Sua execução, ocorrida na noite de segunda-feira, provocou temores no âmbito político que eclipsam amplamente os receios associados à iminente transferência do ex-presidente Jair Bolsonaro para uma penitenciária de segurança máxima.
Em 2 de setembro, vestígios de sua rede de influência no Legislativo surgiram em um pedido de urgência protocolado pelo deputado Cláudio Cajado (PP-BA) para um projeto de lei que autorizaria o Congresso a afastar executivos do Banco Central. Essa interferência na independência da instituição visava obstruir o veto do BC à aquisição do Master pelo BRB, instituição controlada majoritariamente pelo governo do Distrito Federal, que depende de repasses federais para operar.
Cajado, que mais adiante surgiria como o relator ideal na PEC protetora, substituindo outro que se negava a endossar um relatório já elaborado, rapidamente obteve o apoio das lideranças de seis legendas: PP, União, PL, Republicanos e PSB exatamente as que registrariam os maiores índices de aprovação nessa PEC. No dia seguinte, o Banco Central barrou a transação, tornando o pedido de urgência irrelevante.
Foi então que o Master ampliou sua equipe jurídica. Após recorrer a um ex-ministro do STF, atualmente à frente da pasta da Justiça, Ricardo Lewandowski, e a Viviane Barci de Moraes, cônjuge do ministro Alexandre de Moraes, Vorcaro contratou o ex-presidente Michel Temer.
O primeiro passo da estratégia de defesa de Vorcaro consiste em um habeas corpus a ser submetido na manhã de quarta-feira ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região. O mandado de prisão partiu da 10ª Vara Federal do Distrito Federal. Diante das evidências de tentativa de evasão flagradas no momento da detenção, a tarefa dos advogados se apresenta como extremamente desafiadora. De acordo com a Polícia Federal, o plano envolvia um voo de Guarulhos (SP) em aeronave particular rumo ao paraíso fiscal de Malta, enquanto a defesa alega destino a Dubai. Essa suposta fuga coincidiria com o dia em que se anunciou uma operação de aquisição do Master por uma companhia cujo capital social representava apenas 0,1% do valor prometido na proposta.
A consciência da fragilidade de suas operações sempre incentivou Vorcaro a destinar recursos generosos para obter salvaguardas. Um ano antes de a insustentabilidade de seu modelo baseado na emissão de títulos com remunerações bem acima das taxas de mercado vir à tona com a oferta do BRB, o Master financiou um encontro em Londres reunindo figuras proeminentes da elite política brasileira.
Batizado de “Fórum Jurídico Brasil de Ideias”, o seminário teve como debatedores três integrantes do STF (Moraes, Gilmar Mendes e Dias Toffoli), o procurador-geral da República, Paulo Gonet, o advogado-geral da União, Jorge Messias, os senadores Ciro Nogueira (PP-PI) e Davi Alcolumbre (União-AP), além do diretor-geral da Polícia Federal. Andrei Rodrigues relatou à CPI do crime organizado que as irregularidades financeiras ligadas à estruturação do esquema podem totalizar R$ 12 bilhões.
Com a decretação da liquidação, tornar-se-á mais evidente a divisão de responsabilidades entre os participantes da alavancagem arriscada do Master, abrangendo desde os principais detentores de debêntures, como XP e BTG, até os regimes de previdência de entes públicos do Rio de Janeiro e de municípios. O Fundo Garantidor de Crédito (FGC) anunciou que 1,6 milhão de aplicadores, portadores de R$ 41 bilhões em CDBs, qualificam-se para indenização. Esse resgate recorde no histórico do FGC demandará contribuições extras de grandes instituições financeiras, o que contribuiu para a desvalorização de suas ações na véspera. A turbulência envolvendo o Master levou essas entidades a defenderem alterações no sistema, incluindo a inclusão de fintechs no custeio do FGC.
As conexões de Vorcaro no universo político também asseguraram influxos de capital de fundos de pensão públicos. Enquanto bancos e startups financeiras prosseguiram na distribuição de CDBs do Master mesmo em meio à agonia da instituição, esses fundos estatais mantiveram a delegação da rentabilização das aposentadorias de seus funcionários a Vorcaro, apesar dos sinais claros de escassez de liquidez. O Rioprevidência, com R$ 2,6 bilhões investidos no Master, ignorou advertências do Tribunal de Contas do Rio e prosseguiu com os investimentos.
Cláudio Castro, governador do Rio de Janeiro, e Ibaneis Rocha, do Distrito Federal, compõem o par de chefes de Executivos estaduais mais vulneráveis às ligações com Vorcaro. Em escala menor, administrações municipais de São Paulo, a exemplo de Cajamar e São Roque, preservaram suas participações no banco, contrariando alertas do Ministério Público de Contas paulista.
A Operação Carbono Oculto, que apurou a lavagem de recursos oriundos do crime organizado via fundos de investimento, expôs ainda outra origem de ganhos para o Master que pode agravar a situação de Vorcaro. A instituição captou recursos de um dos investigados na Carbono Oculto, gerido pela Reag de João Carlos Mansur, que foi alvo de mandados de busca e apreensão na operação. Pelas estratégias adotadas por Vorcaro em sua busca por imunidades, pode-se prever que ele empregará todos os esforços para evitar a detenção. Tal determinação representa o principal motivo de apreensão em Brasília.
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