O governo do Brasil busca capitalizar a oportunidade inicial de aproximação direta entre os chefes de Estado, garantindo que a fase de aproximação não se dissipe sem avanços concretos. Essa estratégia ganhou forma após um contato fugaz nos corredores da 80ª Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), em Nova York, na terça-feira (23 de setembro de 2025), onde o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, trocaram um abraço e poucas palavras.
A interação, que durou cerca de 38 segundos, surpreendeu diplomatas e analistas, especialmente diante das fricções recentes entre os dois países, incluindo tarifas de 50% impostas pelos EUA sobre importações brasileiras em julho deste ano. Antes da ONU, as relações bilaterais enfrentavam um impasse, com cancelamentos de agendas e pouca perspectiva de diálogo. No entanto, contatos discretos entre autoridades de alto nível de ambos os lados, iniciados meses atrás e acelerados após a condenação do ex-presidente Jair Bolsonaro, pavimentaram o terreno para esse momento. Esses canais sigilosos, com aval direto de Lula e Trump, envolveram emissários como o vice-presidente brasileiro Geraldo Alckmin e o Representante Comercial americano Jamieson Greer, sinalizando disposição mútua para um avanço.
Durante seu discurso na Assembleia, Trump dedicou tempo ao Brasil, destacando uma "química excelente" com Lula e afirmando: "Eu o vi, ele me viu e nós nos abraçamos. Nós concordamos que nos encontraremos na próxima semana. Não tivemos muito tempo para conversar, uns 20 segundos. Ele pareceu ser um homem muito legal, na verdade. Ele gostou de mim, eu gostei dele. E eu só faço negócios com pessoas de quem gosto." O republicano também descreveu Lula como "um cara legal" e indicou que o encontro poderia ocorrer em breve, possivelmente por telefone, videoconferência ou presencialmente.
Lula, por sua vez, reagiu com otimismo em coletiva de imprensa no dia seguinte (24 de setembro), ao final de sua agenda na ONU. "Eu tive outra satisfação de ter encontro com o presidente Trump. Aquilo que parecia impossível, deixou de ser impossível e aconteceu", disse o petista, referindo-se à surpresa do contato ao deixar o palco após seu pronunciamento. Ele enfatizou a preferência por um diálogo equilibrado: "É bom, desde que na lógica do ganha-ganha", e não descartou um formato presencial, inclusive em Washington ou no resort Mar-a-Lago, na Flórida, residência de Trump. "Pode ser presencial, podemos ainda discutir", completou, acrescentando que não se opõe a uma conversa pública: "Não trataremos de segredos de Estado, por mim pode ser público."
Embora não haja data ou local confirmados até o momento, fontes ligadas ao Planalto especulam sobre cenários como a viagem de Lula a Roma, em 13 de outubro, para um evento da FAO (Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura), ou a Kuala Lumpur, na Malásia, em 25 de outubro, para uma cúpula da Asean (Associação de Nações do Sudeste Asiático). Trump poderia comparecer a um desses compromissos, facilitando o encontro. Outra ala do governo brasileiro defende uma ida a Mar-a-Lago para um papo mais descontraído, longe do formalismo da Casa Branca.
A imprensa internacional ecoou o episódio com análises variadas. O Washington Post destacou o "encontro inusitado e, às vezes, constrangedor" na ONU, notando que Trump subiu ao pódio logo após Lula, cujo governo ele havia criticado por sanções ao aliado Jair Bolsonaro. Já o El País elogiou o brasileiro como um dos poucos líderes que "não se curvaram às medidas unilaterais" de Trump, mas viu na interação uma "porta aberta para reconciliação". No entanto, alertas sobre os riscos persistem: historiadores como Robert Dallek advertem para o temperamento volúvel do americano, que pode alternar elogios e críticas abruptas, transformando reuniões em "espetáculos" televisionados com potencial para humilhações públicas.
Apesar de uma acusação isolada de um senador republicano, que alegou que Lula recusou um convite presencial e o chamou de "covarde", o presidente brasileiro reafirmou o interesse em prosseguir. A diplomacia brasileira, liderada pelo chanceler Mauro Vieira, mantém as articulações em sigilo para evitar interferências ideológicas do Departamento de Estado americano ou de alas radicais em ambos os lados. O foco agora é definir termos que evitem armadilhas, priorizando temas como comércio onde Lula nega déficits e rebate tarifas "injustas" –, soberania e democracia, sem colocar em xeque princípios como a independência judicial brasileira.
Esse "momento" de interesse mútuo representa uma brecha valiosa para o Brasil, que visa não só amenizar tensões econômicas, mas também reposicionar o país no cenário global ao lado de Washington.
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